Exegetas menores gregos dos sécs v-vi

Depois do grande flores cimento da escola antioquena e dos co­mentários contemporâneos de Cirilo, a exegese cristã tende a se voltar para si mesma e, como que esgotada, a dirigir-se para os autores do passado e repeti-los. Esse esgotamento era em parte perceptível já em Teodoreto de Ciro, a cuja produção interminável não correspondia uma adequada riqueza de idéias, mas uma notável repetitividade. O menor significado da produção exegética cristã no século V deve-se também ao fato de ela ter-se perdido em grande parte, o que nos im­pede de reconstruir os perfis desses escritores com suficiente segurança. Por isso, também seremos obrigados a apresentar pouco mais que um magro repertório de notícias.


ADRIANO
Chegou até nós, atribuída a um não muito conhecido Adriano, uma In­trodução às Sagradas Escrituras, que tem o objetivo de explicar expressões fi­guradas e particularidades estilísticas do texto sagrado, e sobretudo do Antigo Testamento. Constitui motivo de interesse o fato de ser empregado aqui, pela primeira vez, para o texto sagrado, o termo de "introdução", que já existia para obras análogas da filosofia pagã, como a de Porfirio à lógica de Aristóteles. Seja como for, os critérios exegéticos desse desconhecido Adriano parecem próxi­mos dos da escola antioquena, com a exortação a evitar interpretações demasia­do rebuscadas, e a praticar uma leitura prudente.


VITOR DE ANTIOQUIA
Como indica a cidade de que provém, também este exegeta parece ter pertencido à corrente de Diodoro e de outros de seus seguidores. Não temos noticias dele, a não ser que a um presbítero com esse nome, originário de Antioquia e que viveu por volta do ano 500, foi atribuído um Comentário ao Evangelho de Marcos: um Vítor é freqüentemente citado nas Catenas de comentários ao AT e ao NT.

O texto desse Comentário revela inúmeras divergências entre um ma­nuscrito e outro, que o contêm. Parece ser uma obra de compilação, na qual as contribuições pessoais do autor são muitos menores que as extraídas de outros.


ESÍQUIO DE JERUSALÉM
Esíquio fora monge no claustro de Eutimio e na época do patriarca Juvenal de Jerusalém já gozava de certa fama. Esíquio teria sido sacerdote há tempos, quando, em 412, Círilo começou seu patriarcado em Alexandria, e logo teria atraído a atenção de todos com seu ensinamento. A data de sua morte é incerta: segundo relatos antigos, teria sido testemunha ocular de um milagre ocorrido em Jerusalém em 451. Esíquio é considerado santo pela Igreja grega.

Esíquio é provavelmente o autor dos Escólios aos Salmos, que foram publicados em 1746 com autoria atribuída a Atanásio, mas que não per­tencem ao bispo de Alexandria. A obra é constituída de uma coletânea de escólios, nesse caso muito breves, a maioria na forma de glosas mar­ginais, freqüentemente constituídos de poucas palavras, que ilustram ora uma, ora outra expressão, ora parafraseiam um versículo, e visam não tanto à exegese propriamente dita, quanto a uma edificação moral. Essa insólita tentativa exegética explica-se pensando que o comentário de Esíquio talvez se destinasse à liturgia.

Esíquio dedicou-se também ao comentário dos livros proféticos: co­mentou Isaías, Daniel, Ezequiel e os doze Profetas Menores. Chegaram até nós os Comentários a Isaías e escólios aos outros comentários, conti­dos nas catenas (são mais abundantes os escólios ao Comentário aos Profetas Menores). O título do prólogo a toda a obra exegética de Esíquio sobre os profetas, em seu conjunto, é interessante porque nos informa sobre a maneira como o autor procedia em seu trabalho: Divisão em estíquios dos doze profetas de Isaías e de Daniel que tem ao lado a expli­cação das passagens mais difíceis. O título soa um tanto insólito (como o método exegético, aliás), e significa que o texto bíblico era dividido em pequenas unidades pelo próprio Esíquio, de maneira diferente da divisão da Septuaginta, e que trazia à margem glosas explicativas das passagens difíceis. Cada perícope era precedida de um "capítulo" ou "resumo", que continha em poucas palavras o tema da própria perícope.

Chegou até nós, traduzido em latim, um amplo Comentário ao Le­vítico, que teria sido composto provavelmente nos anos 430-450, em Jerusalém ou em suas proximidades. Recentemente, M. Aubineau des­cobriu duas Homilias para a Páscoa, as quais, celebrando a cruz de Cris­to, apresentam também a cristologia de Esíquio, que parece ser mais próxima dos ensinamentos dos alexandrinos que dos antioquenos.

Esíquio escreveu também obras não-exegéticas. Entre elas se inclui uma His­tória da Igreja, da qual nos ficou apenas um fragmento relativo a Teodoro de Mopsuéstia: foi conservado por ter sido lido durante o quinto concílio ecumêni­co, realizado em Constantinopla em 553, e chegou-nos em tradução latina.


AMÔNIO DE ALEXANDRA
Amônia teria sido um presbítero da Igreja de Alexandria, que atuou por volta da metade do século V. Esta parece ser sua correta colocação cronoló­gica, embora outras tenham sido propostas (foi um outro Amônio, que viveu mais tarde, o autor de um Comentário ao Hexameron e de uma obra contra os monofisitas). O de Alexandria a quem nos referimos deveria ser identificado com um Amônio cujo nome aparece freqüentemente como autor de inter­pretações em várias Catenas exegéticas do Antigo e do Novo Testamento. E citado por algumas observações sobre os Salmos e sobre Daniel, estas últimas mais numerosas, que derivam provavelmente de um comentário propriamente dito que se perdeu, ou de um ciclo de homilias dedicadas àquele texto profético. Uma parte notável dessas é dedicada à história de Suzana e, no todo, elas revelam um considerável interesse pelo conteúdo formal do livro. Mais amplo e mais rico é o Comentário ao Evangelho de João, formado de escólios que se encontram nas Catenas. Ele se apresenta quase como um comentário comple­to, e parece ser um sólido trabalho de exegese. Amônio examinou também explicações que considerava equivocadas e procurou estabelecer o conteúdo dogmático do texto, para rejeitar vários erros doutrinais. Fragmentários e em parte passíveis de reconstrução a partir das Catenas são outros dois trabalhos de exegese: o Comentário aos Atos dos Apóstolos e as Anotações sobre a primeira epístola de Pedro.

Com a passagem do século V ao VI, a atividade exegética diminui ainda mais e se acentua o caráter compilativo que se encontrou nos escri­tores recordados até agora. Esse esgotamento de uma exegese original é testemunhado pelo surgimento de um gênero literário que, de um lado, quer ser o mais funcional e útil possível ao estudioso da Escritura, mas, de outro, eleva ao máximo grau o defeito dos textos precedentes, o de ser compilativos, na medida em que todo o comentário é uma compila­ção. Referimo-nos às chamadas "catenas", às quais já aludimos algumas vezes: o termo traduz o equivalente grego, com o qual se visualiza (se assim se pode dizer) a estrutura de determinado tipo de comentário, baseado exclusivamente em uma série de perícopes exegéticas de prove­niência diferente, colocadas uma após a outra quase como se formassem uma corrente. O autor dessas catenas preferiu comentar cada passagem do texto bíblico selecionado dirigindo-se aos comentadores que o prece­deram, escolhendo de cada um deles os comentários relativos, reunindo­-os e acrescentando só o nome do autor.

Além disso, goza de um crescente sucesso uma outra forma literária que já havia começado há tempos, a das "Perguntas e Respostas" sobre problemas de conteúdo religioso, quase sempre dogmático e exegéti­co. Também esse gênero literário passará a ter importância fundamental no sistema cultural bizantino. A exegese predominante continua a ser a alegórica, depois que os critérios do literalismo e da crítica histórica se esgotaram.


PROCÓPIO DE GAZA
Gaza, cidade da Síria, teve um relativo esplendor e certa atividade cultural durante algumas décadas entre o século V e VI. Ali se encontravam escolas de notável valor, e delas provavelmente vieram escritores que se distinguem por um bom nível de cultura retórica e filosófica: Corício, Enéias e Zacarias Escolástico são alguns desses literatos; os dois primeiros são apenas nomeados, porque não foram escritores de eventos cristãos, embora provavelmente tenham sido cristãos.

A eles deve-se acrescentar Procópio, que viveu entre 465/475 e 528/538, que, em contrapartida, se dedicou principalmente à exe­gese das Escrituras. Foi também escritor profano, e algumas infor­mações sobre ele chegaram até nós graças a seu aluno Corício, que escreveu um discurso fúnebre a seu respeito.

Como exegeta, Procópio é conhecido precisamente porque ele mesmo foi autor de catenas. Escreveu uma Catena sobre o Octateuco, sobre a qual também preparou uma segunda redação, na forma de um comentário continuado e homogêneo, uma vez que a primeira havia atingido dimensões excessivas. Nesse comentário, ele não cita mais as opiniões dos exegetas precedentes, mas as resume; ainda que a estrutura não seja mais a da catena, continua a ser um comentário que, na essência, reúne exegeses alheias. A Catena propriamente dita, da qual é derivado o Comentário, não chegou até nós; da segunda redação recebemos, em grego, apenas um fragmento relativo a Gn 1-17, descoberto pelo cardeal Mai.

Outras catenas compiladas por Procópio são:

- uma Sobre os quatro livros dos Reis e sobre os dois livros dos Paralipomenos, que se perdeu quase inteiramente, com exceção de algumas citações;

- uma Sobre Isaías, ou, mais exatamente, uma Epítome das diversas exege­ses propostas sobre o profeta Isaías, bastante ampla, mas que tem na parte central vastas e consideráveis lacunas. Essa Catena baseia-se em três co­mentários: o de Cirilo de Alexandria, que possuímos, e os de Eusébio de Cesaréia e do ariano Teodoro de Heracléia, que chegaram até nós apenas nas catenas;

- descoberta pelo cardeal Mai, uma Epítome de exegeses selecionadas sobre o Cântico dos Cânticos, análoga às precedentes na forma. Esse comentário cita abundantemente Gregório de Nissa, Cirilo de Alexandria, Nilo de Ancira e outros;
- uma Epítome de exegeses selecionadas sobre os Provérbios de Salomão, baseada em Basílio, Evágrio Pôntico, Dídimo, o Cego, Eusébio de Cesaréia e Oríge­nes. Parece ser espúria.

A partir de tudo o que foi dito, evidencia-se que Procópio não pode ser considerado um exegeta propriamente dito; ao contrário, pode-se observar que as fontes em que se baseia são sobretudo as da exegese alexandrina.

São interessantes as Epístolas (163 ao todo) que nos fornecem boas informações sobre o ambiente intelectual de Gaza, mas são substancial­mente pobres de conteúdo: contêm elogios da retórica e da filosofia, consolações de amigos, recomendações junto aos poderosos e outros temas análogos.


OLIMPIODORO DE ALEXANDRIA
Contemporâneo de Procópio, Olimpiodoro, diácono de Alexan­dria, é bem pouco conhecido; sua atividade desenvolveu-se depois de sua ordenação por João III Nikiotes, que foi patriarca de Alexan­dria entre 505 e 515-516. Olimpiodoro, contudo, diferentemente de Procópio, não escreveu catenas, mas verdadeiros comentários.

Chegou-nos na íntegra um Comentário ao Eclesiastes, no qual Olimpiodoro não cita nenhum de seus predecessores, embora os utili­ze amplamente. A forma desse comentário é semelhante à das catenas, ainda que o escritor dê a sua obra uma nota mais pessoal, na medida em que submete a exame e a discussão o material derivado de outros.

Antes desse comentário, Olimpiodoro teria escrito também um ao Livro de Esdras, que se perdeu.

Lembramos ainda: um Comentário a Jeremias, que compreende também o livro de Baruc e as Lamentações, a maior parte do qual se conservou também em uma Catena sobre o profeta Jeremias.

Uma catena sobre Jó, compilada pelo metropolita Niceta de He­racléia no século XI, conservou-nos fragmentos de um comentário de Olimpiodoro àquele livro.


COSMO INDICOPLEUSTE
Atendo-nos ao primeiro significado do sobrenome, Cosma foi chama­do "Indicopleusta", ou seja, "navegador da Índia", depois de ter realizado uma viagem que o levou ao Ceilão, para onde se dirigira como mercador. Na verdade, seu próprio nome, Cosma, é simbólico, porque deve ser rela­cionado ao grego kosmos, ou seja, o mundo que ele havia descrito em sua obra. Mas nem o nome de Cosma nem o sobrenome de "Indicopleusta" são originários: eles aparecem somente nos séculos X e XI, em manuscritos das catenas exegéticas aos Salmos e aos Evangelhos.

Sabemos dele apenas o que ele mesmo nos narra. Com base nas referências incluídas em sua obra, somos informados de que ele está escrevendo o segundo li­vro dessa obra em 547-549; está às voltas com algumas dificuldades, que consistem provavelmente em suas polêmicas contra os eruditos de Alexandria, eternos inimi­gos da escola antioquena a que ele pertence (é antioqueno já por nascimento), e mais provavelmente ele, nestoriano, é obrigado a contender com os monofisitas de Alexandria. Declara que não teve uma educação acurada, e isso é confirmado pela própria obra, um tanto desordenada na estrutura e nos conteúdos. Fócio chega a julgá-la "vulgar na expressão, que ignora até a sintaxe corrente".

Cosma tornou-se famoso por sua obra geográfica, que tem o nome de Topografia cristã: não é uma obra geográfica em sentido científico, mas de exegese da cosmografia bíblica. O escritor, de fato, polemiza com os geógrafos, os astrônomos e os matemáticos pagãos, e se remete às cosmografias de Moisés e dos escritores sagrados.

Portanto, a terra, sustenta ele com base no primeiro e no segundo livro da Escritura, não é uma esfera, mas um disco, e essas afirmações são demonstradas mais amplamente no terceiro e no quarto livro. O quinto livro contém um resu­mo da história bíblica e também um compêndio da ciência bíblica de sua época, enquanto trata dos propósitos e dos conteúdos da Escritura. Os cinco livros se­guintes têm o objetivo de eliminar as dificuldades e as dúvidas que os primeiros haviam suscitado o sexto se fixa na grandeza do sol; o sétimo na duração do céu; o oitavo no cântico de Ezequias, o rei de Judá, e no eclipse solar mencionado por Isaías 38' o nono no curso das estrelas e o décimo, enfim, acrescenta uma série de testemunhos dos padres. Segue-se uma inesperada descrição das belezas da ilha de Taprobana (Ceilão). Talvez esse décimo primeiro livro seja extraído de uma "descrição da terra", que Cosma havia escrito e que ele mesmo CIta no decorrer de sua obra. O décimo segundo livro, provavelmente acrescentado depois como o décimo primeiro, mostra que muitos escritores pagãos antigos testemunham a antigüidade das obras escritas por Moisés e pelos Profetas.

Como se vê, trata-se de uma exegese muito atenuada: nela, que ainda assim continua a ser o interesse principal, inseriu-se o gosto pela narração e pela apresentação das coisas maravilhosas que pertencem a este mundo, e sobretudo aos mundos distantes, da Índia e do Oriente.

O adjetivo "cristã" dado ao título de Topografia significa que nosso autor não quer expor uma obra de conteúdo geográfico no sentido cientí­fico da palavra, mas quer apresentar uma descrição do mundo segundo as concepções dos cristãos - ou melhor, de um grupo de cristãos - em opo­sição às dos falsos cristãos, que seguem as doutrinas dos eruditos gregos, isto é, substancialmente, a de Ptolomeu. Por trás do nome de Ptolomeu, que vivera quatro séculos antes, na verdade se deveria ver, segundo Wol­ska-Conus, o ensinamento de João Filipono, comentador de Aristóteles e cristão. E verdade, porém, que Filipono nunca é nomeado por Cosma; só será possível ter maior segurança a esse respeito quando se conhecerem aos ambientes culturais de Alexandria e de Antioquia do século VI.

Segundo Cosma, quando Deus quis criar o homem, decidiu que sua criatura, antes de se unir, ao final dos tempos, a seu criador, deveria per­correr um caminho de aprimoramento, duas "catástases", ou seja, duas "condições cósmicas". A primeira está submetida à morte e à mudança, a segunda é imutável e eterna, e nela terá lugar o conhecimento perfeito. Ao primeiro estado corresponde o mundo terreno, limitado pela terra, em­baixo, e pela abóbada celeste, ao alto; acima existe o reino dos céus, incor­ruptível e eterno. Essa doutrina das duas condições parecia ter derivado, em última análise, da escola exegética de Antioquia, e, mais precisamente, da contemporânea a nosso escritor, a escola nestoriana de Nísibe.

A exegese de Cosma parece muito simplista se comparada à de per­sonalidades bem mais cultas e mais profundas que a sua, contudo existiu também uma exegese do texto sagrado mais humilde e simples, porque dela não se serviram apenas os eruditos e os religiosos, mas também os incultos e as pessoas de pouco espírito critico, que davam importância ao maravilhoso. Por isso a obra de Cosma encontra, também nesse âmbito, uma justificação.


ECUMÊNIO DE TRICA
Esse é um personagem praticamente desconhecido; obtemos informações sobre sua vida a partir de um Comentário ao Apocalipse, de sua autoria, descober­to há 70 anos. Nele, o autor declara escrever cerca de 500 anos depois da visão de João. Nessa obra, além disso, referências relativas às doutrinas cristãs e mais precisamente à cristologia e à doutrina de Orígenes sobre a apocatástase, ,conde­nada por volta daquela época em Constantinopla, permitem situar Ecumenio no século VI; enfim, esse comentário não demorou a ser traduzido para o siriaco no século VII. Assim, ele teria atuado na segunda metade do século VI e, de acor­do com o que se lê em um resumo desse Comentário, seria originário de Trica, cidade da Tessália.

Pode-se extrair algum outro detalhe sobre as concepções dogmáticas de Ecumênico em sua obra: ele seria partidário do monofisismo; teria professado, além da unidade da Pessoa e da hipóstase de Cristo, também a unidade da ener­gia; Ecumênio tomaria como base especialmente Cirilo de Alexandria, afirmando que Cristo "provém de duas naturezas", em vez de "ser duas naturezas", como esclarecera o Concílio de Calcedônia. O Comentario sobre o Apocalipse e precedi­do de um prefácio em que o autor, referindo-se às autoridades dos Padres precedentes, defende a canonicidade e a autenticidade do Apocalipse, freqüentemente contestada no Oriente.


ANDRÉ DE CESARÉIA
Não temos certeza nem sequer sobre a época em que viveu André, arcebis­po de Cesaréia. Nos tempos desse exegeta, Jerusalém ainda se encontrava sob o domínio bizantino e, portanto, André viveu antes de 637, quando a Cidade de Cesaréia foi conquistada pelos árabes. Polemiza com Ecumênio, embora este não o cite explicitamente e, seja como for, considera-o ainda vivo naquela época.

André também escreveu um Comentário ao Apocalipse, dividido em 24 tratados cada um com três capítulos. Esses números, como diz o autor, possuem um significado simbólico: os 24 tratados correspondem aos anciãos do Apocalipse e o número três corresponde à tripartição em corpo, alma e espírito de cada um deles. Em correspondência a essa tripla divisão, André, de acordo com Origenes, afirma a existência de um triplo nível de escritura, corpórea, psíquica e espiritual, ou seja, como ele explica, um significado literal (e, portanto, histórico), um tro­pológico, que parte das realidades sensíveis para chegar às espirituais, e um ana­gógico, que oculta os significados dos mistérios futuros. Entre os livros sagrados, alguns são permeados predominantemente por um significado, outros por um significado diferente; no Apocalipse domina o significado anagógico, e por esse motivo a exegese daquele livro, continua ele, é particularmente difícil.

No decorrer da narrativa, em dois momentos André se deixa levar por lon­gas digressões de conteúdo dogmático, ambas as vezes contra o origenismo. É provável que um dos estímulos para a composição desse comentário tenha sido precisamente a controvérsia origenista.


Por MORESCHINI, C. & NORELLI, E. Manual de literatura cristã antiga grega e latina. São Paulo: Santuário, 2005.


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